12 agosto 2012

Paternidade


Essa talvez seja a aventura mais inusitada da minha vida. De certa forma, eu sempre quis isso, mas jamais imaginaria que aconteceria da forma que foi, tampouco que seria no momento que aconteceu. Eu não tinha dimensão do que era e talvez hoje ainda não tenha.

Ser pai não é algo facilmente mensurável, por mais que seja banal. Qualquer homem tem potencial para sê-lo. Porém, o lidar com aquela criaturinha, que tem tanto de mim que às vezes eu vejo uma cópia, é uma experiência tão particular e única que me proporcionou uma perspectiva de vida completamente diferente.
Ser pai para mim não foi uma condição existencial ativa. Eu não sou pai por mim, não é algo que me tornei. 

Eu me vi na condição de pai quando aquele bebezinho estava choramingando cólicas e se acalmava quando eu o deitava no meu peito e em poucos minutos o meu respirar o conduzia a um sono tranquilo. Mas não era eu, era ele.

Eu sempre imaginei passar uma série de gostos, manias, vontades, sonhos para o meu filho. Ainda mais vendo tanto de mim nele. Mas cada dia, ainda mais pela distância que a vida fez ter entre nós, vejo que as coisas não serão como meus sonhos. E mesmo que essa distância não existisse, também não o seria, pois a vida dele vai se desenhar com contornos próprios. O máximo que eu posso fazer é estar lá para viver isso com ele.

Ser pai, no meu caso, tem sido um imenso privilégio. É a alegria da simplicidade do que ele quer e precisa. É alguém que me agarra pelo pescoço só para gritar “papai, não quero mais suco” ou para me ensinar que a vida pode ter muito mais vista ao se compartilhar uma risada pelo copo de suco ter se espatifado no chão e deixado tudo amarelo.

Não consigo ver num dia como foi o de hoje razão para que eu seja festejado. Eu sou apenas um resultado. O que eu quero e tive para um dia de hoje foi uma degustação disso que é ser pai.

29 maio 2012

Tempos do mimimi insuportável


Devemos realmente estar próximos a um frenesi incontrolável. As pessoas estão com os nervos expostos, com a sensibilidade aflorada a níveis críticos. Só é possível encontrar essa razão para o patamar de coitadismo que alcançamos.

Manifestações claras de falta de bom senso e evidente falta de senso de humor. Uma pequena tirada, uma simples brincadeira tem sido resultado para manifestações públicas de repúdio. Bandeiras contra discriminação têm sido levantadas contra piadas. O humorista é o grande terrorista do século XXI, pelo visto.

Algo completamente ignóbil e inacreditável está sendo realizado com a Nova Schin. Não sei quantos de vocês tiveram a oportunidade de assistir ao mais recente comercial da marca de cerveja. É hilário. É uma simples brincadeira, que simula uma “sacanagem” de um grupo de amigos com um membro que se considera o conquistador.

Cena do comercial da Nova Schin retirado do ar
Os amigos arrumam um travesti para o amigo. Que quase é enganado. Pronto, a piada é essa. O cara não queria o traveco e quase caiu no canto. Isso foi o suficiente para um levante do movimento de transformistas contra o comercial. Algo completamente imbecil.

Ou seja, para o movimento, se o cara não achar lindo ter sido empurrado a um travesti ele está sendo preconceituoso? Isso não pode ser colocado em um comercial de cerveja? Já é tão raro um comercial da bebida não ser praia e mulheres seminuas, quando algo diferente é feito, é combatido por causa de uma bobagem?

O comercial não coloca o travesti como uma má pessoa, alguém ruim; não faz nenhuma insinuação pejorativa que deprecie o travesti. Apenas coloca que o rapaz, heterossexual acabou se sentindo atraído por ela, pois foi ludibriado pelos amigos. Ora, como se isso não acontecesse e não fosse o objetivo de um transexual chegar ao grau de aparência do sexo oposto que seja confundido como sendo este? Ou os participantes do BBB 11 foram preconceituosos ao não reconhecerem Ariadna como transexual durante a convivência com ela?

Mesmo assim, a pressão realizada pela organização levou a Nova Schin a retirar o comercial do ar e do próprio Youtube. E o comercial era bom. Uma pena.

Outro movimento completamente desproporcional é dos grupos de adoção. Estão criando todo um barulho por causa de uma piada do filme Os Vingadores (The Avengers). No meio do filme, o personagem Thor defende o vilão Loki por ser seu irmão e é confrontado com o fato de Loki ter matado mais de 80 pessoas em dois dias. Para justificar, Thor diz que o Loki é adotado.

Para os fãs da história, isso tinha um peso de humor ainda maior. Pois os fãs sabem que a construção da personalidade de Loki está completamente atrelada ao fato de ser o irmão adotado mais novo de um deus nórdico. Por ser mais fraco, ver o irmão ascender como um herói, o querido do pai, tudo isso contribui para personalidade de Loki. Esse contexto atrelado ao fato de ser adotado são o combustível utilizado para o conflito interno do personagem que o faz decair de um deus nórdico a um vilão.

Isso inclusive é explorado no primeiro diálogo entre Loki e Thor no filme. Com isso, a piada ganha algo mais precioso, seu contexto. Fazer um levante por causa de uma piada feita dentro de um contexto que não visa depreciar quem é adotado. É evidente que a adoção envolve uma série de problemáticas a serem enfrentadas pelos pais e pela criança. E uma das possíveis problemáticas foi utilizada para construção da personalidade do vilão e o personagem é bom porque essa construção é verossímil a possibilidade; os ciúmes, a inveja, o sentimento de rejeição, a negação, são todos sentimentos viáveis e reais. Isso tornou Loki palpável.

Mas infelizmente tudo que foi enxergado pelos movimentos estava nas letras amarelas da legenda “Ele é adotado”. Houve mães de filhos adotados reclamando que se sentiram constrangidas ao assistirem ao filme com as crianças. Utilizo crianças, pois as mães que reclamavam possuem filhos menores de 12 anos.

A classificação do filme é de 12 anos. Ou seja, ele não é recomendado para crianças, apenas para maiores de 12 anos. Se a mãe expos o filho menor a um filme que não é indicado pelos produtores, pelo conselho regulador e pelo próprio cinema para aquela criança, a responsabilidade pelo constrangimento é toda dela.

Eu entendo que uma criança possa se sentir diminuída pela piada, pois não terá condições de compreender o contexto. Mas pudera, a película não foi feita para que ela entendesse. Não ainda. Há muita revolta para uma situação que foi criada por quem está revoltado.

Se fosse desta forma, não se poderia fazer piadas com míopes, gordos, carecas, estrangeiros... Alguém sempre estará relacionado a um grupo minoritário e identificado por uma característica física ou social qualquer. Por isso não se pode falar de ninguém ou de nada? Estamos contaminados por essa cultura do politicamente correto e nos deixamos escravizar.

As pessoas estão muito frágeis. E estão frágeis porque estão acanhadas, assustadas, como um pequeno animal selvagem que levou uma pedrada e não consegue fugir mais. A reação instantânea é a de agressão; você em algum momento na sua vida foi atingido, por isso pegou o trauma, isso o colocou na defensiva. Aconteça o que for, mesmo que não seja algo direcionado a você, sua resposta imediata será a autodefesa, mesmo que cega e irracional.

É preciso desarmar, do contrário nunca poderemos aproveitar a vida, nunca poderemos sair do lugar. Pois, se a cada mero entretenimento ficarmos de mimimi, tudo que conseguiremos é destruir nossas próprias vias de escape desse caos que nos faz ficar cada dia mais neuróticos.

É preciso relaxar mais e entender que a diferença entre apologia contrária e uma simples brincadeira. No comercial e no filme, era tudo brincadeira. Todo mundo sabe. Todo mundo viu. Ninguém passou a tratar mal transexuais por causa do comercial. Ninguém vai deixar de adotar por causa do filme. Um pouco mais de senso de humor, por favor.

17 maio 2012

O crime do sucesso


 Desde que obteve êxito em identificar quem obteve as fotos de Caroline Dieckmann, a Polícia Federal tem recebido críticas. É um tanto quanto engraçado. Afinal, eles fizeram o trabalho deles com velocidade e eficiência, o que mais você quer que a polícia faça senão o trabalho dela de forma correta e eficiente?

Entendo que nossa polícia é sim deficiente, a impunidade é crescente e evidente, principalmente nos altos escalões da sociedade. Os criminosos do colarinho branco ficam por muitas vezes impunes, mesmo quando expostos. Mas se o sistema é falho em um âmbito, por que é errado que ele funcione em outro?

Dieckmann é uma cidadã brasileira, com os mesmos direitos que eu e você. Mas é evidente que por sua profissão ela possui uma exposição muito maior, qualquer conteúdo de sua vida privada que seja divulgada ganhará um volume de atenção e mídia muito superior a outra mulher que seja bem sucedida numa área de atuação que não envolva mídia. É justo e notório que quem espalhou tal conteúdo de foro íntimo tenha atingido o ganha-pão da atriz, sua imagem.

Há quem goste de dizer que ela mereceu, pelo fato de ter produzido tal conteúdo em foro íntimo. Há quem diga que isso não aconteceria com outras atrizes que expõem sua nudez nas revistas, se ela tivesse feito o mesmo, teria ganhado pelo menos dinheiro. Mas Dieckmann não quis usar sua nudez como forma de sustento, preferiu construir outra imagem para si, fazendo de sua ação como atriz seu meio e não seu corpo. Aquilo que era sua sensualidade, sua nudez, seria de aproveito íntimo.

O crime de Dieckmann foi a intimidade com seu conjugue. Ela realmente gerou a possibilidade para exposição ao produzir o conteúdo e hospedá-lo, mesmo que temporariamente, em seus e-mails. Mas em todo esse processo, tudo estava restrito ao foro íntimo e isso foi violado. Quando isso ocorreu, além da privacidade, o dano à imagem, há o impacto a família. Ela é esposa, é mãe, é filha. Isso atinge outras pessoas.

Carolina nunca quis que sua imagem fosse exposta desta forma. Por mais que nossa cultura trate de forma natural essa nudez exposta de forma pública e tenha um comercio vivido e estruturado. Porém, fazer parte deste mercado é uma escolha. Fazer de sua privacidade um negócio é uma escolha pessoal. E não fazer de sua privacidade um negócio não significa não fazer uso dela. Então, neste ponto, sim, isso é um violação da liberdade da atriz e sua família.

Por isso, era fundamental uma ação ágil e correta da Polícia Federal. A vida de várias pessoas estava sendo prejudicada por uma clara ação ofensiva e criminosa. O conteúdo estava na web, sendo divulgado e ganhando exposição colossal. Conteúdo amador de cunho sexual ganha exposição, claro, mas não com a amplitude que recebe o de alguém com grande exposição de mídia. O anonimato conferido as pessoas fora da mídia faz com que um deslize como esse de outra pessoa não seja tão impactante como para alguém que vive de sua imagem.

Então, a revolta de pessoas comuns cresce, pois por Dieckmann foi feito o que precisava ser feito. O sentimento de que o mesmo não teria sido feito por uma pessoa “comum” ou que não havia empenho da PF em outros casos é compreensível, mas não quer dizer que seja justo.

A Polícia Federal não julga, não dá veredito. Ela executa ações mediante a Justiça ou age a partir de investigações. Porém, o cumprir da lei só pode ser realmente executado pela Justiça. A Polícia pode até prender, mas quem dá a pena é o Tribunal.

Pode faltar qualificação, pode faltar recurso, mas não acredito em omissão da polícia, seja no tocante aos corruptos ou à violação dos direitos de privacidade de Dieckmann. Se o sistema como um todo agiu de forma correta em um caso e não no outro, não se deve criar irritação com a ação correta, mas por que a ação não é bem feita na outra.

Se nossos corruptos estão impunes, devemos nos revoltar quando a justiça é feita em um caso menor? Não acredito que seja esse o caminho.

É evidente que temos o direito e devemos nos indignar com a impunidade de criminosos e gestores públicos corruptos. Porém, isso não quer dizer que a justiça esteja errada em ser ágil e direta na manutenção do direito individual de uma pessoa. Seja ela notória ou não. Nesse caso, minha impressão é de um bom trabalho, feito de forma que não é realizada nem mesmo em países com problemas mais intensos com Hackers.

Não podemos tratar como um crime a operação policial bem sucedida. Pois, no momento que a necessidade de preservação do direito seja minha ou sua, a expectativa deve ser de uma ação eficiente e correta, mesmo que o caso seja de aparente ínfima importância coletiva e grande relevância particular.

10 maio 2012

Geração leite com pera



Sempre me senti um velho num corpo jovem, mas como estou começando a ficar velho mesmo, fico mais a vontade para soltar minhas frases rabugentas.

E vou dizer a clássica, no meu tempo a juventude era melhor. Não que fosse boa, mas a de hoje é um lixo. Cheios de não me toques, frescos, mimados e ainda recebem uma proteção imbecil dos politicamente corretos.

Esses adolescentes/jovens não possuem gosto, noção ou respeito. Não dão duro, são considerados gênios por terem conhecimento superficial sobre ferramentas de social media. Vão trabalhar como se estivessem indo ao Shopping ou passear no Ibirapuera. E se consideram neste direito por serem novos e descolados na modernidade.

Afinal, nasceram arautos do conhecimento e capacidade, não?

Não. A verdade é que essa geração cresceu no conforto, numa perspectiva de que a vida é fácil e que as coisas simplesmente acontecem para você. Seus pequenos dramas internos parecem ser a pior coisa do mundo. Uma geração arrogante que cresceu vendo tv globinho e tomando Todinho. Quando acaba seu leite, o mundo entra em choque.

Se as pessoas não fazem o que você quer, não pensam como você, não estão programados de acordo com seus desejos e perspectivas, você é um injustiçado, perseguido, coitado. Afinal, ninguém nesse mundo sofre com mais nada, o único problemas são seus dilemas e vontades, não?

Um grande drama está sendo desenhado por conta de um suicídio de um homossexual nos EUA. Ele tinha um relacionamento com outro rapaz e quando contou para família, não foi aprovado. Os familiares criticavam o rapaz por sua opção e faziam comentários sobre.

O que roda as redes sociais é que o rapaz se matou por conta das críticas da família. Porém, colocar o peso do próprio suicídio sobre a família, pelo fato de sua família não concordar com algo que foi optado por si não é nada mais que ridículo. É algo comum dessa geração que quer ter todos os mimos e que o universo gire em torno de seus desejos e vontades.

Seja o que quiser, independente de aprovação das outras pessoas, sejam quem forem. Assuma para si o ônus de quem você é e de suas escolhas. A vida é assim; suor e lágrimas para depois haver sorrisos.

Shane, homossexual que se suicidou e culpou a família
Antes de qualquer mérito, ninguém é obrigado a concordar, aceitar, achar bonito qualquer coisa se faça, seja ou escolha. Ninguém pode lhe impedir de ser, fazer ou estar, mas não precisam compactuar e louvar você, principalmente sua família.

Os politicamente corretos irão dizer que isso é um absurdo, terrorismo e atraso mental, que os homossexuais sofrem com a aceitação por parte da família. Mas a verdade é que o homossexual tem que estar preparado para uma negativa de sua família sobre sua condição. A vida não é doce. A vida não é justa. Se você quer ser quem ou o que quiser, você precisa enfrentar as consequências e exigências da vida que você escolhe.

Ninguém é obrigado a aceitar nada. Ninguém é obrigado a compactuar com o que eu quero para minha vida. A realidade é que deve haver o respeito pela liberdade de ser. Seja o que quiser. Mas enfrente isso. Não queira que façam uma festa para você quando você assumir qualquer posição sobre sua vida. E isso vale para qualquer coisa. Profissão, crença, sexualidade, ou o que quer que seja.

A vida é amarga e indelicada. Ela é incorreta e desproporcional. Os direitos não são iguais e as pessoas não são justas. E isso será assim para sempre. Aprenda a conviver com isso. Ou volte para o sofá de seus pais para assistir tv globinho enquanto degusta um saboroso Tody.

02 maio 2012

Réquiem do ego insólito


Às vezes me pergunto quando foi que o mundo desandou. Onde nasceu o carma que fez que nossa humanidade se colocasse em decomposição? O que nos faz seres nefastos e indiferentes aos nossos iguais? Por que da gritante necessidade de assepsia social?

Nossa organização social básica vem da formação e elevação do ego sobre outros indivíduos. A primeira organização básica de seres humanos, desde nossa gênese, é privativa. A liderança familiar era exercida por um homem.

O filho mais velho, o varão primogênito, receberia maior importância que os demais da herança de seu progenitor, além do posto de liderança familiar. Era elevado sobre os demais no único e prévio princípio de casta. Não era necessariamente o mais capacitado, com maior potencial, apenas o privilegiado pela ordem de geração. O privilégio da casta.

Desde nossa formação básica o nosso princípio social é elevar-se sobre os demais. Desenvolvemos o sentimento de posse e a necessidade de valoração sobre outros indivíduos para o reconhecimento de nossa própria existência. Isso ultrapassa os valores absorvidos do capitalismo, é a necessidade humana de diferenciação dos demais.

Sob essa via, todas as possibilidades de um indivíduo se diferenciar e sobrepor a outro indivíduo foram desenvolvidas. O impulso da mais natural a mais nefasta forma de segmentação social foram criadas.

Qual o cerne do impulso para desenvolver xenofobia? Antissemitismo? Homofobia? Higienização social? É fazer a si mesmo reconhecido como diferente ou não permitir que o outro se diferencie, não aceitar a capacidade de outro indivíduo de não seguir os padrões básicos de normalidade para que o meu ego não seja sobreposto.

É deste centro que temos movimentos contra uma estação de metrô no centro do bairro de Higienópolis, uma associação de mulheres paulistanas da elite, cidadãos sendo chamados de “gente diferenciada”, camarotes para castas políticas – como retratado no texto do Andy.

Aquilo que há de mais gritante é o impulso de ser algo apenas para diferenciar-se de forma qualificada de outro. Há uma necessidade de aplauso, há um vício voraz na sensação de superioridade. O capitalismo, na realidade, se alimenta desse desejo inquietante que temos de ser alguém através do que temos, do que possuímos. O cerne do capitalismo não é ter posse, mas como a posse nos qualifica parente aos outros, como ela nos faz sentir em referência aos demais.

A grande chave é tornar a posse algo de valor, atribuir sensação de exclusividade. Usuários do Iphone e Ipad se sentiam superiores ao usar o Instagram, pois esse recurso só era disponibilizado para hardware da Apple. Com a compra do recurso pelo Facebook, houve a disponibilização para aparelhos com sistema Android. Com isso, a massa de usuários que teria acesso ao recurso cresceria de forma considerável.

Usuários dos produtos Apple começaram a se manifestar contrariamente a liberação do recurso para outra plataforma, com o pretexto que “gente diferenciada” começaria a utilizar o Instagram e ele seria inundado por conteúdo “inapropriado”.

Contas em Tumblr foram criadas para satirizar essa invasão dos “pobres” ao Instagram. Pura manifestação de imbecilidade, egocentrismo, arrogância e prepotência.

Exemplos de conteúdo "útil"
de usuários do Instagram
O Instagram por natureza já era uma rede de conteúdo raso e irrelevante. Fotos do cotidiano de gente completamente desinteressante que não retransmite em suas publicações nada de importante na imensa maioria das postagens. As redes sociais de conteúdo pontual e curto não têm por natureza a razão de utilidade em seus conteúdos. É mera convivência social.

Pifiamente, qualquer conteúdo que seja fora da realidade da pessoa não existirá em sua rede, pois a verdade é que a rede social existe para você ter contato com pessoas que são do seu círculo social, pessoas da sua área de convivência. O conteúdo que você consome nessa rede é das pessoas que você se relaciona. O conteúdo que você recebe foi construído e designado por você ao construir sua relação virtual com essa pessoa.

Toda essa turba odiosa pelo uso do recurso por mais pessoas na verdade é pela desconstrução da exclusividade. Era a raiva da odiosa desconstrução do seu sentimento de status pelo patético fato de ter comprado um aparelho de celular ou tablet específico. O status que ostentava pela marca – usar Instagram era sinônimo de ter Apple e ter Apple era uma forma de demonstrar status – havia sido corrompido por aquilo que esses usuários consideravam ser a oferta do mesmo recurso aos pobres.

Usuários IOS e Android em pé de guerra?
É evidente que o Android possibilita a popularização de recursos. O sistema está disponível em aparelhos mais acessíveis e possuí um volume muito superior de aplicativos grátis. Porém, há aparelhos com o sistema Android que possuem preço de mercado superior ao Iphone, por exemplo.

A diferença é que esses aparelhos não ostentam o status. Seus usuários, nesse momento, o preferem por recursos oferecidos ou gosto, não pela imagem que ele acrescenta. Não que isso torne esses usuários melhores, isso só faz quem usa um Iphone por status uma pessoa sugada pelo sistema de imagem e ego, ou seja, uma pessoa facilmente manipulável pelo sistema.

Churrasco de gente diferenciada em Higienópolis
Reação ao réquiem do ego insólito
Somos seres corrompidos pelo desejo de nos elevarmos sobre os nossos iguais sobre parâmetros fúteis e efêmeros. Criamos um sistema cruel apenas para alimentar o ego de uma seleta casta que está lá pelo único privilégio de ter nascido nesta posição. Odiamos o nosso igual desfavorecido em aspectos sociais a invés de lutar para igualdade de condições de sobrevivência dessas pessoas. É um retrato amargo e patético como espécie.

Somos a espécie que luta contra a sobrevivência de si mesma. O ser humano é o único ser que reclama para si a existência de Deus e a única espécie nesse mundo que age como se não existisse um.

24 abril 2012

Quem perdeu o limite, o Pânico ou você?



Foi grande o barulho sobre o Pânico na Band ter raspado o cabelo de uma de suas dançarinas. De fato, o programa conseguiu uma medição de audiência pelo Ibope impressionante para a emissora que está; foram 12 pontos.

Logo após passar a máquina na cabeça da Panicat Babi começou o frisson no Facebook e no Twitter. O Pânico normalmente já é Trendind Topic no Twitter, pois a base do seu público é jovem e está na rede social. A maior parte de suas campanhas está ligada ao Twitter e essa ferramenta foi o termômetro desta ação, foi dali que o programa retirou a “prenda” para sua colaboradora.

Porém, minha atenção foi captada pelas fotos com a Panicat tendo sua cabeça raspada que circularam pelo Facebook. Frases de indignação, depoimentos de quão assustadas as pessoas estavam na busca do Pânico por audiência. A frase mais recorrente é que o Pânico perdeu o senso de limite, não havia mais noção nas ações do programa.

O grande negócio está que o Pânico sempre se propôs a essa conduta anárquica, sem limitações, repleta de controvérsias. O Pânico não tem o objetivo de chocar, mas de promover o bizarro que você quer ver. O espetáculo deste domingo foi o grito da multidão que clamava. A Panicat aceitou e recebeu bem pelo seu papel de “gladiadora” moderna e foi o circo que o programa precisava para rentabilizar seus ganhos expandindo sua audiência.

Você pode achar o que aconteceu ridículo. Eu também acho. Considero uma ação completamente idiota. A maioria das mulheres que raspa o cabelo o faz por questões de saúde. Não é uma imagem com a qual se deva brincar.

Mas o Pânico está ai exatamente para isso. Para fazer o que ninguém mais teria coragem, por ser algo completamente estúpido e idiota. E esse programa fará isso, pois é o circo que você quer ver. Essa repercussão já era esperada por eles. Já sabiam que o ódio de alguns viria, mas o escárnio e diversão de um grande número também aconteceria.

O Pânico nada mais é que um reflexo do que você quer ver no seu lado mais baixo, como audiência. Querendo ou não, isso faz parte de nossa sociedade. Esse é o entretenimento preferido de nossa nova geração. Essa é a grande cultura que ela ingere. A nossa massa vangloria a incultura e santifica hediondo. Nossa massa não tem limites.

E nisso o Pânico foi genial. Pois seus produtores sabem do que vivem e fazem o que é preciso para terem seu ganho, seu sucesso. O Pânico não tem limites, mas não é por si próprio; é porque nós, sua audiência, não temos. No fim, o programa nada mais é que mero reflexo.

Quando o CQC subiu num pedestal...


Quando o CQC foi ao ar pela primeira vez, eu fiquei impressionado. Estava na faculdade de comunicação social e aquilo era exatamente o sonho de qualquer amante do jornalismo diferenciado. Eram perguntas acidas, repletas de ironia e inteligência. A mesmice da televisão havia se dissipado em quadros de utilidade pública.

Celebridades ficavam sem respostas frente a perguntas retóricas. Políticos ficavam sem chão quando deparados com os questionamentos que todos gostaríamos de fazer. Aquele CQC não tinha respeito por quem não merecia nenhum.

Mas com o passar do tempo, o desgaste ocorreu. O programa evoluiu pela pressão comercial, seu integrante mais medíocre – aquele que não acrescenta absolutamente nada no aspecto jornalístico e intelectual – Marco Luque passou a ter mais espaço e importância por sua rede de contatos publicitários. O programa passou a ter uma tendência cada vez mais amarrada a interesses comerciais frente à integridade de seu conteúdo.

Esse é um movimento natural em toda mídia. O problema é que isso interfere diretamente na qualidade do programa. Isso culminou na saída de Rafael Bastos do quadro do programa e da Rede Bandeirantes, consequentemente. Não que a saída de Bastos seja por si a queda de qualidade, pois com o próprio Rafael essa descendente ocorria.

Muitas coisas contribuíram para que o programa se envaidecesse e desvirtuasse. O CQC passou a ganhar prêmios como programa de comédia, de humor. Jamais foi reconhecido como programa jornalístico pelo meio. Passou a ser ostensivamente comparado ao Pânico. Isso claramente influenciou na linha do programa.

Os quadros com “brincadeiras” e abordagens completamente irrelevantes passaram a ser mais frequentes. Não há jornalistas no CQC, hoje, há apenas humoristas. Nenhum deles se porta como um profissional de mídia com consciência e responsabilidade de interesse público. Há um exagero no tratamento de questões que mostra total despreparo e total tendência para demonizar entrevistados.

Isso ficou evidente nas matérias feitas pelos dois novos “repórteres”. Ao dar de ombros para um entrevistado de Alagoas durante uma entrevista, um deles mostrou claramente a total falta de respeito pelo entrevistado e por um tratamento isento para manifestação do entrevistado. Tudo que esses dois senhores têm buscado é deixar os objetos de suas “entrevistas” como personagens caricatos para suas piadas e ofensas.

A explosão deste fato gritante ocorreu na semana passada, durante a visita de Hillary Clinton, atual Secretária de Estado dos Estados os Unidos da América, ao Brasil. Era uma visita oficial, tratando de assuntos extremamente delicados que exigiam alta postura diplomática.

Qualquer pessoa que tenha o menor trânsito no meio da comunicação sabe a dificuldade que é conseguir que o governo norte-americano conceda uma coletiva de imprensa durante uma visita oficial deste teor e situação. E quando isso ocorre, há toda uma organização e decoro que são utilizados por se tratar da relação direta entre representantes de distintas nações. Ou seja, o que acontece num evento desses pode também influenciar a relação diplomática e a futura realização de coletivas de representantes desse país visitante.

A brincadeira realizada pelo “repórter” Maurício Meireles constrangeu a comitiva estadunidense e os representantes brasileiros. A insistência do membro do CQC em entregar seu presente gerou desconforto e sim, pode ser a causa de futuras dificuldades para toda imprensa brasileira em questões de cobertura internacional.

Meireles poderia ter feito perguntas inteligentes. Poderia ter desconcertado Hillary confrontando com questões sérias e falhas da gestão de Obama. Mas preferiu balançar uma máscara de carnaval e agir como uma criança mimada.

A ação por si só já seria de terrível embaraço. Porém, ao exibir a matéria, o CQC cortou todo o constrangimento, confusão e revolta causada por seu repórter. E não se contentou com isso. Marcelo Tas, a quem eu por muito tempo tive admiração, me decepcionou profundamente.

Tas ironicamente afirmava que o CQC não possuía poderes para afetar relações diplomáticas. Mas Tas sabe que relações diplomáticas são afetas pelas amenidades mais absurdas e irrisórias. Tas não é ingênuo. Tas retrocedeu de um jornalista inteligentíssimo para um mediador de comediantes. Retrocedeu ao dizer que foi uma brincadeira inocente o que houve e que nenhum constrangimento ocorreu. Que a revolta de jornalistas foi à toa.

Tas reclamou do posicionamento do Sindicato dos Jornalistas de Brasília de pedir a restrição da credencial do CQC para eventos políticos. Mas quando reclama desse posicionamento, Tas ergue o CQC ao status de programa jornalístico e coloca sua censura como uma ameaça, a abertura da brecha para censura de todo o jornalismo.

Porém, Tas em seu discurso esquece de algo crucial; para que a censura ao CQC tenha potencial de censura jornalística, é preciso que o CQC em algum momento volte a produzir jornalismo. Independente de interesses comerciais. Independente do quadro de repórteres e apresentadores.

Hoje, o CQC é meramente um programa de humor. E um programa de humor medroso. Pois tenta a alcunha de audacioso, mas não tem coragem de ultrapassar qualquer limite, como tem o Pânico. Tenta pegar para si a estirpe de humor inteligente, mas tudo que consegue é ser agressivo e arrogante. Tenta ser inovador e diferenciado, mas tudo que tem feito são as mesmas piadas velhas.

A tristeza está que o CQC subiu num pedestal e se perdeu de sua grande qualidade, que eram os pés firmados no chão de quem simplesmente queria dizer o que precisava ser dito. E infelizmente hoje diz qualquer coisa apenas para ser ouvido.

23 abril 2012

Público ou coletivo

Nosso sistema de transportes é público apenas na gestão
Eram 15h40 de domingo, um tempo irritante que não se decidia entre um calor tímido e chuviscos de uma chuva gélida. O ponto de ônibus do início da Avenida Tucuruvi estava quase vazio, com apenas seis pessoas.


Eu não estava bem vestido, pelo contrario, estava bem do avesso, depois de um sábado a noite especial. O domingo parecia vadio e preguiçoso, apenas me convidando a recolher ao ócio.


Mas antes disso, precisava pegar o costumeiro ônibus para casa. Estava lá eu, sentado no banco do ponto, ao meu lado um senhor com um livro e do outro uma senhora. Em pé, meio distantes, estavam três homens. Sujos, magros, cabelos bagunçados, barbas sujas, magros, mal agasalhados e sem um centavo no bolso.


Passa o primeiro ônibus. Era um que seguia sentido à Cantareira. Eles dão sinal, ônibus para. Abre a porta e um deles se aproxima e conversa com o motorista. Ao notar o teor da conversa, o motorista fecha a porta com o homem no primeiro degrau. O homem pedia para ir até o final da avenida, três pontos à frente. Mas não tinha dinheiro para isso. Ele e os outros dois amigos.


Outro ônibus passou e nem ao menos parou para ele. Um dos amigos se revoltou. Esbravejava que era uma vergonha. “Transporte público para quem? Nós não temos transporte público!”.


O corajoso triplamente rejeitado pelos motoristas sorriu. E apenas pediu calma ao amigo. Apenas murmurou “é coletivo, não público”. Um homem simples, aparentemente, com o domínio muito simples do que é o braço do nosso serviço público.


Uma troca de frases despretensiosa, carregada com uma leitura clara da realidade. A única característica dos nossos serviços públicos é a de serem organizados pelos nossos órgãos e instituições do Estado. Mas não são públicos. Não são serviços disponíveis para todos, não é algo aberto de forma irrestrita a qualquer cidadão. É um serviço coletivo, é uma divisão da necessidade de locomoção de um grupo de indivíduos. E possui um pré-requisito para participação: A passagem.


Você precisa participar de uma forma de obter o direito a utilização do serviço coletivo. Para isso, paga uma passagem. Veja bem, você já pagou o imposto, de alguma forma. Seja pelo consumo ou outras vias que o governo possui de tributar o cidadão. Você já possibilitou a existência desse serviço. Porém, ele é um serviço particular para um coletivo de pessoas: aqueles que pagam a passagem.


Os três homens precisam se deslocar por uma pequena distância, para o coletivo. Porém, para o estado que se encontravam, era uma longa distância para o estado que se encontravam. Principalmente levando em consideração o estado debilitado de um deles, que havia acabado de sair de uma internação e estava visivelmente abatido.


Eu pude seguir meu caminho, pois faço parte do coletivo. Mas por que pagamos um preço tão algo por uma coisa pública que, de fato, não existe?