23 abril 2012

Público ou coletivo

Nosso sistema de transportes é público apenas na gestão
Eram 15h40 de domingo, um tempo irritante que não se decidia entre um calor tímido e chuviscos de uma chuva gélida. O ponto de ônibus do início da Avenida Tucuruvi estava quase vazio, com apenas seis pessoas.


Eu não estava bem vestido, pelo contrario, estava bem do avesso, depois de um sábado a noite especial. O domingo parecia vadio e preguiçoso, apenas me convidando a recolher ao ócio.


Mas antes disso, precisava pegar o costumeiro ônibus para casa. Estava lá eu, sentado no banco do ponto, ao meu lado um senhor com um livro e do outro uma senhora. Em pé, meio distantes, estavam três homens. Sujos, magros, cabelos bagunçados, barbas sujas, magros, mal agasalhados e sem um centavo no bolso.


Passa o primeiro ônibus. Era um que seguia sentido à Cantareira. Eles dão sinal, ônibus para. Abre a porta e um deles se aproxima e conversa com o motorista. Ao notar o teor da conversa, o motorista fecha a porta com o homem no primeiro degrau. O homem pedia para ir até o final da avenida, três pontos à frente. Mas não tinha dinheiro para isso. Ele e os outros dois amigos.


Outro ônibus passou e nem ao menos parou para ele. Um dos amigos se revoltou. Esbravejava que era uma vergonha. “Transporte público para quem? Nós não temos transporte público!”.


O corajoso triplamente rejeitado pelos motoristas sorriu. E apenas pediu calma ao amigo. Apenas murmurou “é coletivo, não público”. Um homem simples, aparentemente, com o domínio muito simples do que é o braço do nosso serviço público.


Uma troca de frases despretensiosa, carregada com uma leitura clara da realidade. A única característica dos nossos serviços públicos é a de serem organizados pelos nossos órgãos e instituições do Estado. Mas não são públicos. Não são serviços disponíveis para todos, não é algo aberto de forma irrestrita a qualquer cidadão. É um serviço coletivo, é uma divisão da necessidade de locomoção de um grupo de indivíduos. E possui um pré-requisito para participação: A passagem.


Você precisa participar de uma forma de obter o direito a utilização do serviço coletivo. Para isso, paga uma passagem. Veja bem, você já pagou o imposto, de alguma forma. Seja pelo consumo ou outras vias que o governo possui de tributar o cidadão. Você já possibilitou a existência desse serviço. Porém, ele é um serviço particular para um coletivo de pessoas: aqueles que pagam a passagem.


Os três homens precisam se deslocar por uma pequena distância, para o coletivo. Porém, para o estado que se encontravam, era uma longa distância para o estado que se encontravam. Principalmente levando em consideração o estado debilitado de um deles, que havia acabado de sair de uma internação e estava visivelmente abatido.


Eu pude seguir meu caminho, pois faço parte do coletivo. Mas por que pagamos um preço tão algo por uma coisa pública que, de fato, não existe?

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